sábado, 22 de outubro de 2022

Nós Dois


Nós Dois
 
Foi gostoso acordar e ficar velando teu sono
E, ao sair, deixei sobre o travesseiro uma flor;
Dormia tão serena que não pude te acordar,
E deixei a rosa como um sinal do meu amor.
 
Queria te trazer o café da manhã na cama,
Você bem que merece muitos mimos assim,
Mas oportunidades para isso nunca faltam,
Como você mesma vive dizendo para mim.
 
De verdade, não sei se já fui tão feliz assim!
Se fui, certamente foi n’alguma vida passada,
Uma vez que nesta nada sequer se aproxima,
É nisto que penso, ao acordar de madrugada.
 
Sei que o dia para mim vai demorar a passar,
E estou feliz por saber que para você também;
Não vejo a hora de voltar para os teus braços,
Uma vez mais poder chamar-te de meu bem.
 
Falar do nosso dia, jantarzinho íntimo, vinho...
O amor e a ternura cedendo ao fogo da paixão;
Após o prazer, nossas almas leves como plumas,
Ditam as regras e o ritmo dos nossos corações.
 
Nardélio Luz
221022


quarta-feira, 19 de outubro de 2022

Na Roça é Assim


Na Roça é Assim...
 
Água do poço, só bebo inté o armoço...
Na janta é aquela engenheira especiar,
Que é só pamode o pó da garganta tirar,
E lubrificá a goela, seca dentro do pescoço.
 
Já no nascê do sor, nóis pega no cabo da enxada...
Os trapo que nóis veste, o suor branqueia de sar,
Na capina do fejão prantado no meio do milharar,
E de noite é truco e viola, a alegria da pionada.
 
Sim sinhô, a vida é dura, mais num tem nada mió
Do que vê a chuva chegano lá daqueles cafundó,
Pra dá aos bichos de bebê e fazê as pranta crecê.
 
É o mió chero do mundo, o chero da terra moiada...
Pamode fazê a prece, dexa a “Duas-cara” incostada,
Num ixiste vida mió, isso eu agaranto pra vosmecê.
 
Nardélio Luz
191022


quarta-feira, 12 de outubro de 2022

Alma Errante


Alma Errante
 
Deixo a estrada me levar
Para além daquela curva,
Lá, onde a vista fica turva,
E não há mais como voltar.
 
Não preocupo com destino,
Ou se um dia eu vou chegar;
Não vou para nenhum lugar,
Nesse meu febril desatino.
 
Eu não busco nada perfeito,
Sendo eu o próprio defeito,
Porque perfeito não existe.
 
É lá no fim dessa estrada,
Onde não existe mais nada,
Que a alma errante insiste.
 
Nardélio Luz
121022
 

sábado, 1 de outubro de 2022

Espinhos



Espinhos

Flor solitária que adorna meu caminho,
Já fazes parte desta minha difusa história;
Como antes me tocaram os teus espinhos,
É teu perfume que hoje toca a memória.

Se bem me lembro, eras tu a mais amada,
E nem sempre viveste tão solitária assim;
Até pelas místicas orquídeas era invejada,
Foste a mais bela e preciosa do jardim.

Amávamo-nos com a lua por companhia,
E as bênçãos do que era divino ao redor;
Minha carne te despia das pétalas macias,
E o vento boêmio enxugava nosso suor.

Quando era chuva, chorávamos com ela,
Urros de êxtase que jamais se ouvira igual;
Após o amor, um belo arco-íris de aquarela,
Em uma hipnótica languidez atemporal.

Éramos, se bem me lembro, sonhadores,
Por paragens tais que em nada facilitavam;
Porém, embora vencêssemos os dissabores,
Eram as graças que sempre nos faltavam.

Quando a fadiga por fim nos alcançou,
Surgiram dúvidas inexistentes até então;
Foi quando o fogo que te impelia se apagou,
E o teu amor abandonou meu coração.

Longos tempos, aqueles, sem esperança,
Em que apenas se ouviam meus tristes ais;
Hoje, porém, só me resta a tua fragrância,
E, sem espinhos, enfim descanso em paz.

Nardélio Luz
271218