quinta-feira, 28 de abril de 2022

Um Sonho Bom



Um Sonho Bom

Esta noite eu sonhei com você;
Havia tempos que não sonhava.
Foi bem simples, mas eloquente:
A vida, por si só, nos encantava.
 
O dia já seduzia a noite, do céu
Índigo, desabavam luzes pálidas;
O contexto mudava todo o redor,
Como nas antigas madrugadas.
 
Não havia pressa naquele sonho,
De mãos dadas na exígua estrada;
A zoada das abelhas nos girassóis,
E o cheiro bom da terra molhada.
 
Nas úmidas árvores mais longe,
Os felizes passarinhos cantavam;
Os tons de verde revezavam além,
Até onde nossos olhos avistavam.
 
Urdíamos planos para o futuro...
Era um porvir que acreditávamos;
Teríamos todo o tempo nesta vida,
E era por tal que nos amávamos.
 
Contudo, ao acordar, fui tomado
Pela frustração servil da realidade.
E a tal consciência bateu imediata:
Que para nós já era deveras tarde.
 
Porém, ainda resta um consolo...
Faculta, sobretudo, acreditarmos:
Tivemos que abrir mão nesta vida,
Para numa futura nos amarmos.
 
Nardélio Luz
280422
 

 

terça-feira, 26 de abril de 2022

Lições


 Lições
 
O poema que escrevi para ela,
Foi de pouco ou nenhum valor;
Então percebi que só importava,
Quando deveras existia o amor.
 
Quando o que sentia era real,
A toda dedicação se valorizava;
E até um rabisco mais simples,
Calava fundo que ruborizava.
 
Afeição vertia-se em lágrimas,
Da mais verdadeira felicidade;
E ansiávamos por exterminar,
Aquela onipresente saudade.
 
Por um bom tempo foi assim,
Até perceber que tudo mudara;
E ela não mais se sensibilizava,
Porque o sentimento acabara.
 
Sua atenção um tanto forçada,
Meio que parecia uma leve dor;
E até mesmo o seu “Obrigada!”
Traduzia a ausência do amor.
 
De todas as lições desta vida,
Essa de fato custei a aprender:
As coisas importantes, a gente
Só valoriza depois de perder.
 
Nardélio Luz
260422


sábado, 23 de abril de 2022

Timidez

 

Timidez
 
Houve um tempo de inocência,
Quase esquecido lá no passado,
Que eu me deitava na sombra
Da minha árvore favorita,
E sonhava acordado.
 
Lembro como se fosse ontem,
De ficar ali sobre o gramado;
Um sorriso bobo nos lábios,
Na mente a imagem dela,
E viajava sossegado.
 
Certa feita descobri com alegria,
Desenhado com tinta amarela,
Um coração com as iniciais
Da moça e deste matuto,
Na parede da casa dela.
 
Aquilo foi a felicidade mais pura,
Mas uma grande timidez existia;
Nunca expus meus sentimentos,
E quando foi embora, pensei
Que nunca mais a veria.
 
Até que anos depois, na cidade,
A procurei e falei o que sentia,
Mas era muito tarde pra nós,
E ficou bem claro pra mim
Que eu jamais a teria.
 
Nardélio Luz
230422

quinta-feira, 21 de abril de 2022

Desilusão


Desilusão
 
Estive conversando com uma pessoa,
Desiludida a ponto de não crer no amor;
E pude sentir o quanto sua vida é triste,
O quanto é considerável seu dissabor.
 
A minha empatia foi deveras imediata,
E desvelei para colocar-me no lugar dela;
Inobstante, por mais que tenha tentado,
Foi impossível sentir o mesmo que ela.
 
Muito embora hoje eu esteja sozinho,
Já pude sentir o que é o amor verdadeiro;
Experimentei a mais autêntica felicidade,
Quando amei e fui amado por inteiro.
 
Sempre que estava com ela nos braços,
Era como se tudo ao redor despertasse;
A natureza, as pessoas, a própria vida...
Tal como se o amor em nós morasse.
 
Creio, quem nunca amou e foi amado,
Pouco ou nada de sua história escreveu;
Passou em branco pelo próprio enlevo,
E presumivelmente nem sequer viveu.
 
Nardélio Luz
210422

 

segunda-feira, 11 de abril de 2022

Beleza Maligna



Beleza Maligna
 
Quando ela cessou o longo beijo,
Pude sentir o líquido escorrendo
No meu pescoço, morno e espeço,
E então descobri estar morrendo.
 
Despertei diversas horas depois,
Sem dor, numa alcova estranha;
Padecendo de uma sede terrível,
Que me ressecava as entranhas.
 
Pouco a pouco a memória voltou
E percebi não ter mais pulsação;
Só havia silêncio, uma cama suja,
E na penumbra ao lado, o caixão.
 
O demônio que estive caçando,
Era astuto e me pegou primeiro;
Quão irresistível fora sua beleza,
Que roubou meu sopro cabeiro.
 
Desci daquele leito corrompido,
E cambaleei até o escuro caixão;
A estaca rasgou o seio esquerdo,
Estraçalhando o inerte coração.
 
Os berros feriram meus ouvidos,
E a sede acendia como um farol;
Então abri as corroídas cortinas,
Para uma última vez sentir o sol.
 
Nardélio Luz
110422


 

domingo, 10 de abril de 2022

Afortunado


Afortunado
 
Você é uma mulher naturalmente graciosa,
Porém tem dias que parece estar ainda mais;
Agora há pouco mesmo, quando despertamos,
Me olhou de forma que não tinha visto jamais.
 
Teu olhar meigo tocou bem fundo minha alma,
Como se a ternura nele pudesse ser exteriorizada;
Foi quando entendi de onde vinham as emoções,
Que me acometem fundo desde a madrugada.
 
É tanto amor que aparenta não caber no peito,
Não poucas vezes precisa que seja extravasado;
Então fazemos amor até alcançarmos o paraíso,
Em uma devoção distinta de culpa ou culpado.
 
Mirando teus olhos, à sombra do teu sorriso,
Me faculta constatar o quanto sou afortunado;
E embora haja quem não aprove nosso enlace,
Onde há tanto amor, não pode existir pecado.
 
“Bom dia” verbal, e se aninha em meus braços.
Uma bela gatinha a ronronar de tanta empatia;
Tua pele fresca acende todos os meus sentidos,
Revelando o quanto será especial o nosso dia.
 
Nardélio Luz
100422


quinta-feira, 7 de abril de 2022

Separados


Separados
 
Cruzei desertos, singrei mares...
Até cavalguei ventos selvagens...
Pois precisava estar nesses ares,
Nessas tão esquecidas paragens.
 
Quando eu fui obrigado a partir,
Sob ameaças de irados ancinhos;
Não pude nem mesmo despedir,
Da bela dona dos meus carinhos.
 
Agora, daqui de fora dessa janela,
Perscruto-a sob a luz bruxuleante;
Tão perto e, jamais antes tão bela,
Porém, nunca antes tão distante!
 
Ainda que imperem agonia e dor,
E o pesar da impotência sem fim;
Estou livre para rever meu amor,
E isto eles jamais tirarão de mim.
 
Pois que ela ainda continua viva,
Ao passo que eu... Ah, não mais!
E, ainda que permaneça à deriva,
Todo o meu desespero se desfaz.
 
Pois mesmo neste etéreo estado,
És eleita, minha eterna consorte;
E embora tenham nos separado,
Não o farão nesta minha morte.
 
Nardélio Luz
070422