sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

Flagelo


Flagelo

 

Eu a observava quase flutuando sobre a relva...

tais quais os onipresentes capuchos brancos

que gentilmente lhe faziam companhia,

vagando no céu azul da manhã morna.

 

O ar esparzia perfumes diferentes, exóticos,

e chegavam aos meus ouvidos descansados

os guturais versos das lampeiras gaivotas, que

estranhamente pareciam recitar Baudelaire.

 

O suave toque umedecido da maresia

trazia ligeiro conforto à minha pele quente

e um forte contentamento por estar perto do mar...

aquela sensação de fazer parte do mar.

 

Porém um vento súbito fustigou a relva alta ao redor,

chicoteando inclemente meu semblante surpreso,

tais quais os longos e suados cabelos dela

nas nossas noites de sôfrego arrebatamento.

 

O aguaceiro chegou repentino como a desdita...

não houve tempo para reagir... só para gritar...

enquanto trovões zombavam da minha impotência,

gargalhando do meu inútil prélio interior.

 

Arrastada para longe, ela não mais flutuava...

o céu azul se tornara escuro e bravio... o penhasco...

e num último vislumbre um raio feriu severamente

as trevas vingativas que nos flagelavam.

 

Nardélio Luz

200121


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