terça-feira, 24 de março de 2020

Soneto da Morte Invisível




Soneto da Morte Invisível

Invisível e, desse modo, imperceptível,
Vem a morte em seu silêncio sepulcral.
Hétero, gay... o gênero é indistinguível,
Como também a raça ou classe social.

Isolando as famílias em seus abrigos,
Para reaprenderem o que já esqueceram.
E na convivência com os entes queridos,
Buscarem o resgate do que perderam.

Como surgiu não havia quem falasse,
Somente quando já lotava os hospitais,
Permitiram que ao mundo alertasse.

O fato é que não há registro nos anais,
De praga natural ou criada, que matasse
Só os humanos e poupasse os animais.

Nardélio Luz
220320

sábado, 14 de março de 2020

Ter Amigos é Bom Demais




Ter amigos é bom demais!!!

Ontem eu estava no hospital esperando para tomar o antibiótico na veia, quando uma enfermeira do PROGRAMA MELHOR EM CASA (internação domiciliar) se aproximou sorrindo e perguntou:
— O que você está fazendo aqui?
— Esperando para tomar medicação.
— Infecção urinária de novo?
— Infelizmente, sim... Se eu tivesse tantas namoradas quanto tenho essas infecções, superaria Casanova e Don Juan juntos!
Ela deu uma risada gostosa e em seguida continuou perguntando:
— Ué! E por que você não está sendo atendido pelo Programa?
— Bem isto é melhor você perguntar para o pessoal aí — respondi com um sorriso desdenhoso. — Anteontem tentei convencê-los a fazerem isso, mas simplesmente me ignoraram.
— Isso é um absurdo! Você já é paciente do Programa!
— Sim, mas nem todos os funcionários são dedicados como você, infelizmente alguns  só querem facilitar suas próprias vidas, sem ligar um mínimo para o bem-estar dos pacientes. — lamentei sinceramente.
— Espere um minuto! — ela exclamou, um tanto indignada.
Em seguida pegou o celular e ligou na Central do Programa Melhor em Casa, depois retornou para o interior do hospital. Voltou poucos minutos depois na companhia de um dos médicos que havia me atendido na emergência, semana passada.
O médico foi solícito e pediu a etiqueta que estava colada na minha camisa.
— Tudo resolvido — minha amiga disse resoluta. — Como você já está aqui, tomará a medicação, mas a partir de amanhã nós vamos atendê-lo na sua casa.
— Poxa, obrigado!!! Você me quebrou um galhão! — agradeci, realmente aliviado.
— De nada, imagina. Este é o meu trabalho!
— Mas, e você? Está trabalhando aqui agora?
— Não... Só vim ver uma paciente.
— Poxa, então dei muita sorte de reencontra-la aqui hoje!
Minha benfeitora apenas sorriu, se despediu com um abraço e se afastou para a saída.
E, para meu alívio — sobretudo nesses tempos de corona vírus —, a partir de hoje não precisarei ficar indo ao hospital todos os dias.

Nardélio Luz
140320

quinta-feira, 5 de março de 2020

Rosa Cálida



Rosa Cálida

Os toques do meu paladar urgente,
Nas pétalas abertas da rosa quente,
Faziam brotar a abundante umidade.
Aguçando ainda mais a minha libido,
Baralhando todos os meus sentidos,
Levando-me às bordas da sanidade.

Tentava a custo conter os gemidos,
Mas vede que irrompiam espremidos,
Dentre os lábios ávidos que se afligiam.
Ainda que transeuntes pudessem ouvir,
Àquela altura, nada havia que não ali,
Nem sequer as más línguas existiam.

As gotas abundantes se misturavam,
Entre os pelos elétricos, que eriçavam;
Éramos o exemplo da própria felicidade.
Beijos se ligavam e as carnes tremiam,
Como tais os músculos se contorciam,
Atingindo os limites da flexibilidade.

O arrebatamento não tardou a chegar,
Quando o teso abraço aspirou esmagar,
Tornando-se uno o que antes eram dois.
E conquanto o arbítrio pudesse ser duro,
Ali não importava o passado ou futuro,
E toda a agrura era relegada a depois.

Só o que importava era aquele sentir,
Sem qualquer temor ao fadário por vir,
Doados um ao outro da planta à palma.
Carícias, braços nos braços em abraços,
Adormecemos sob o letárgico cansaço,
Saciados desejos do corpo e da alma.

Nardélio Luz
050320