Medo
Entre as árvores mudas da floresta enevoada, tudo parece
Morto. Até mesmo os seres da noite ― que nessas horas tardias
Normalmente manifestam com sons fiéis suas frustrações ―
Se furtam estranhamente de tais instintos ou vontades.
Somente meu coração pode ser ouvido na noite anômala
(E muito alto por sinal!), numa tentativa vã de ser expelido pela
Minha escancarada boca arfante. O frio pegajoso penetra meus
Ossos e o pavor indizível que me abraça é algo indominável.
Mal posso crer que ainda consigo raciocinar com coerência
Suficiente para tornar infimamente inteligível essas palavras
― Que ora expresso em desvario e noutra me calo ―, com o
Medo de ser localizado sobrepujando todos os outros.
Porém, medo de quê? Sim, pois de quem não pode ser!
A exaustão desabilita o resto das minhas forças, enquanto
Sinto os invisíveis arbustos espinhentos rasgarem ainda mais
Minhas vestes e minha carne, já em frangalhos e sangue.
Por fim a profusão de gritos, silvos e agouros alcançam
Meus tímpanos de uma vez, como o estrondo de um trovão.
Meus joelhos finalmente tocam o solo e me entrego ao abraço
Gélido e pegajoso. Incônscio, rezo pela balsâmica loucura.
Porém, em vez do alívio da insanidade, domina o pavor
Das coisas ― mortas ou vivas ― que me cingem. E tal aflição
Leva a intuir como o sol ― filtrado pelas árvores ancestrais ―
Encontrará meu cadáver na manhã que muito ainda tarda.
Nardélio Luz