sábado, 19 de agosto de 2017

Prisioneiro




Prisioneiro


É verdade! É verdade!... Maior liberdade não podia haver,
Quando aquele ser corria de lugar a outro, embalado no prazer.
Ainda que laborioso, era livre, um artista, um nobre vagabundo,
Sorria, bebia, cantava, vivia alheio às mazelas do mundo.

Sim, assim o era: seguia livre, vadio, cumprindo a prazerosa sina;
Onde era irrelevante. Ah, quão doce era a vida! Aquela vida sem rotina!
Desde o princípio, na aprazível vadiagem, o orgulho de ser ninguém;
Às importantes profissões mundanas, escárnio, apenas o desdém.

No dia ou na noite, gozar o que a vida ofertava era o único objetivo;
Dado a valores sem valor, um homem somente, sem nenhum adjetivo.
Porém, há um momento, aquele momento! Aquele que a tudo altera:
Chegara e entrara na doce vida, a musa amante, a onírica quimera.

O cultivo da flor do amor, embora divino, exigia responsabilidade,
Extraindo daquele espírito sorridente e errante, a tão seleta liberdade.
O homem assumiu então de corpo e alma o enaltecido sentimento;
Aprisionando o espírito livre, tal qual um demônio pestilento.

Mas se tudo na vida definha e perece, pareceu findar o gentil amor,
E o espírito encarcerado, ardiloso como só, fez fluir uma falsa dor.
O homem, embaído, foi levado ao basta, à conjuntura desprezar,
A consciência chegou tardia, do artificioso espírito a lhe enganar.

A dor rasgou-lhe o peito, ferindo a alma, impondo veraz agonia,
Buscada a absolvição, ouviu da musa: “vossa compunção é tardia”.
O impetuoso espírito, capcioso como só, que tanto exigira liberdade,
Embora compungido, sentiu-se daí em diante, prisioneiro da saudade.

Não obstante o peito rasgado, o homem recusou se atirar ao vício,
Negou-se à degradação, à fácil entrega, cingindo alçado e nobre ofício.
Em dias claros: o peito nu, os braços fortes, facilitando o trabalho firme;
Nas noites sombrias: amante voraz, cáustico, na busca eterna e sublime.

Gozava o regozijo da paz; então, de repente o baque, a ignóbil paralisia:
O retorno ao inferno e à desesperança, à dor na alma, já umbrosa e fria.
São tempos já idos, ásperos, de portentosa labuta e gélida compreensão,
Levando o homem agonizante, antes livre, à introspectiva resignação.

Hilário como o ingênuo pôde conceber, ser um cárcere o casamento,
Quando é o desdém que finda a liberdade e incute indizíveis tormentos.
Quisera o homem — com seu ego de deus — mudar tal imutável situação,
Na impotência que lhe é infligida, quanta angústia! Só resta a aceitação.

O corpo chora, prisioneiro do ócio, da lembrança, da eterna imobilidade;
Só resta, então, à incorpórea imaginação conceder à ferida e chorosa alma,
a ilusória liberdade.


Nardélio F. Luz


terça-feira, 20 de junho de 2017

Liberdade



Liberdade

Não se sabe exato ou por certo
O que em horas tais a gente diz,
Mas era enfim abolido o incerto
E chegara o tempo de ser feliz.

Nos longos anos de vil calabouço
Sofri das chagas da incredulidade;
Porém a recompensa pelo esforço
Veio com a chegada da liberdade.

Eis que por muito tempo lutamos
Contra a mais execrável segregação,
Porém eis que finalmente chegamos
Ao término da tão longa separação.

Uma vez fora da hórrida escuridão
Provieram os raios de sol me cegar,
E sob os brados deste velho coração
Eis que me foi possível vislumbrar:

Tais quais as lágrimas de alegria
Desciam umedecendo teus cílios,
O orvalho da fria manhã escorria
Nas aveludadas pétalas dos lírios.

E é como descrevo aquela manhã
Esperada por todos os santos dias;
Pois minha mente se manteve sã
Só por crer que você aqui estaria.

Nardélio Luz
200617

segunda-feira, 12 de junho de 2017

Te Amar




Te Amar


Tudo que é lindo me remete a você.
Não adianta distância, tentar escapar,
O universo confabula para nossa união,
E quanto mais luto com essa intenção,
Mais me apanho a te amar e te amar.

Por vezes somos como o sol e a lua,
E é quase impossível de te encontrar.
É então que nos tornamos um eclipse,
E meio assim sem te disse e me disse,
Venho novamente te amar e amar.

Tenho tentado manter um controle,
Mas nem o olhar me é possível desviar.
Duma hora para outra explode a paixão,
E os tremores invadem o meu coração,
Cujo escopo maior é te amar e amar.

E você, minha bela rainha das flores,
Algo acaso que impeça de se entregar?
Diga-me o que para que possa remover,
Daí em diante embalar-te em prazer,
E que possa você me amar e amar.

Nardélio F. Luz
120617


sábado, 10 de junho de 2017

Perdido



Perdido


Despido da treva superficial que,
Supostamente, fazia cinza minha alma,
Eis que já não há qualquer conforto.
O que ameaça meu livre-arbítrio
É deveras mais profundo e impregnado
Do que jamais poderíamos supor.

Creio então, sádico ser satírico,
Que esta necessidade de ficar sozinho
Não pertence só a esta existência.
Seria, portanto, racional supor
Que execrável semente fora plantada
Em eras além desta memória?

Para tanto certamente fora tal
Vida desprovida das virtudes do amor
E coberta por mortalhas de dor.
Porém dane-se a maldita razão
E tu, anjo, com todas as tuas incertezas,
Que mais banem do que acolhem!

A masmorra que isola esta alma
Está além das minhas decisões externas
Ou de qualquer alcance terreno.
No éter negro destituído de calor,
Formas ou qualquer sentimento benigno,
Onde apenas o medo sussurra.

Temo — cada vez mais convicto —
Que nem no teu Céu nem na minha Terra
Haverá luz que possa alcançá-la.
E qualquer esboço de atitude
Ou chance de libertá-la, nefando espírito,
Já se perdera no imemoriável.


Nardélio F. Luz

sexta-feira, 9 de junho de 2017

Vida Após a Vida - O Livro

Título: Vida Após a Vida
Autor: Nardélio Fernandes Luz
Editora: Viena
Ano: 2007
Gênero: Biografia 
ISBN: 85-371-0095-0
Páginas: 384
Formato: 16 x 23









COMO COMPRAR ESTE LIVRO

Depósito bancário / Entrega via Correio
Conta Poupança / Caixa Econômica Federal
Titular: Nardélio Fernandes da Luz
Agência: 0162
Conta: 00032275-3
Preço do Livro: R$ 52,00 (incluídas as despesas postais)
Enviar comprovante de depósito junto com nome e endereço completos para o e-mail: narfeluz@gmail.com


Comentários da capa feitos por profissionais da Literatura e Educação


"Foi um prazer imensurável ler a autobiografia de Nardélio Fernandes Luz. Sinto-me uma pessoa privilegiada, por ter a oportunidade de me encantar com a habilidade extraordinária que este autor possui para detalhar os fatos e transportar-nos para seu mundo de simplicidade e encanto. Sou feliz por ele existir e, assim, por meio da leitura, poder brindar o milagre da vida, que ele representa muito bem".

Ana Floripes Berbert Gentilin
Especialista em Educação Especial, Pedagogia Escolar, Geografia e Meio Ambiente; atua no Núcleo Regional de Educação de Cianorte/ Secretaria de Estado da Educação do Paraná.


"Nardélio apresentou-me outras realidades possíveis. Mostrou-me que a sua vida cheia de dificuldades, com infância e juventude pobres, pouca escolaridade e precariedade profissional e financeira, não impediu que ele se tornasse, antes de tudo, um bom leitor. E que se desenvolvesse nele, também, um exímio escritor, com completo domínio da técnica narrativa, do vocabulário atraente e da correção gramatical. Encantei-me com seu Vida Após a Vida. Vale a pena ser lido".

Maria Joana Barni Zucco
Mestre em Literatura, Revisora de Textos, Preparadora de Originais da Universidade Federal de Santa Catarina.


"A mensagem de vida transmitida por Nardélio vem partilhar o compromisso do bem viver. Com ele aprende-se a ver com os olhos do coração, consegue-se atingir uma visão ampla do sentido da vida e aprende-se a ser flexível, a ponto de buscar ver o mundo através dos olhos dos outros. A sua escrita possibilita viver a empatia e buscar no mais humilde saber, todas as maneiras possíveis e explicáveis de se fazer entender".

Walquíria Onete Gomes
Psicóloga, Mestre em Educação; atua no Núcleo Regional de Educação da Área Metropolitana Sul/ Secretaria de Estado da Educação do Paraná.


"Tive o prazer e o privilégio de ler e acompanhar ‘gestação e nascimento’ do livro Vida Após a Vida, escrito por Nardélio Fernandes Luz. O texto é extremamente emocionante, atraente e nos dá um grande exemplo de luta e de coragem. Os desafios reais que Nardélio enfrentou e ainda enfrenta nos remete a repensar nossos conceitos de facilidade e dificuldade e nos mostram que a força de vontade vence obstáculos inimagináveis". 

Eda Maria de Melo Brustolin
Psicopedagoga, Socioterapeuta, Funcionária aposentada pela Universidade Federal de Santa Catarina.


Texto de Orelhas

Neste livro o autor retrata sua trajetória, desde o mergulho que o deixou tetraplégico em 1998 até aproximadamente cinco anos depois. Com minuciosos detalhes, relata sua fatídica experiência desde a fratura do pescoço ao mergulhar num rio, o período tracionado no hospital – em que numa imóvel horizontalidade só podia mover os olhos e a boca –, as cirurgias, as complicações pós-cirúrgicas, devido às infecções hospitalares que quase o levaram a óbito; a aceitação, a recuperação – apoiado incondicionalmente pela família e amigos –, até a adaptação à nova vida tão limitada.

Entretanto, sua narrativa não se limita ao sofrimento, muito pelo contrário, em meio aos pesadelos quase inenarráveis causados pelo trauma, ele intercala, ora com bom humor, ora com melancolia – traços fortes da sua personalidade – as memórias do passado, evidenciando a separação dos pais; a infância pobre, mas feliz; a tímida adolescência e uma vida adulta quase nômade, repleta de aventuras.

A sexualidade é um dos pontos fortes da sua narrativa: aborda desde as lembranças das experiências na sua vida de andante, passando pelos extremos desejos durante a convalescença, até as experiências pós-tetraplegia, deixando claro que – ao contrário do que a maioria acredita – pode haver plenitude sexual entre os deficientes.

Mas o ponto central do seu relato é a capacidade de aceitação e assimilação do imutável, sincronizada à ferrenha força-de-vontade, determinação e amor pela vida.

Este livro é a prova maior e o testemunho que, conquanto haja adversidades, há vida e felicidade após a paralisia.

Kátia Regina Luz de Carvalho
Graduada em Pedagogia. Prima e melhor amiga do autor.

sexta-feira, 12 de maio de 2017

Acredite




Acredite

Acredite!...
Qualquer hora dessas
As coisas vão acontecer.
Não na tua hora,
Pois embora teu querer seja relevante,
Teu tempo não é...
Teu tempo precisa ser trabalhado
Até que não sobre qualquer resquício
De falsa onipotência
E a humildade galgue um patamar.
Teu querer precisa se encaixar
No tempo e espaço do universo
Para que seja mantido o equilíbrio
Ainda que, com isso,
Possa parecer pertencer
À condição de acaso.
Teus desejos se realizarão,
Mas não no teu tempo...
No tempo de Algo Maior,
Invisível aos olhos,
Mas presente no coração,
Cuja sapiência O faz,
Por conseguinte,
Onisciente.

Nardélio Luz

domingo, 30 de abril de 2017

Caçada




Caçada


A noite calma tenta me acalmar,
Enquanto as horas me devoram.
Já faz tempo que peguei o rastro,
Que se move mais como arrasto.

A bestialidade inominável deixa
Sulcos rubros na lama insalubre.
E os odores malditos do pântano
Bagunçam feio os meus sentidos.

Não creio nessa droga de inferno,
Porém, em seus últimos delírios,
O ancião moribundo mencionou
Algo sobre uma lenda ancestral.

Fala de uma cidadela submersa
Onde hiberna uma antiga besta
À espera do exato alinhamento
De ignoradas estrelas lúgubres.

Ao que parece o diabo acordou,
Mas me topou em seu caminho.
“E eu sou o melhor no que faço,
Ainda que não seja agradável.”

A gosma seca nas minhas garras
E a acidez corrói o adamantium.
O fator de cura do ser tentacular
Deixa o meu abaixo do chinelo.

Não devia fumar numa caçada,
Mas ao diabo com essas regras!
O charuto me mantém na linha,
Lembrando meu lado humano.

Os pelos da minha nuca eriçam
E meu faro capta o fedor ácido.
A besta se arrasta para o mar...
Saciada com sangue humano.

“Eu falhei feio contigo, Xará!”,
Rosno para o confiante Xavier.
A água não é meu ambiente e
Cthulhu retorna vivo a R’lyeh.


Nardélio Luz
300417

sábado, 22 de abril de 2017

Descrença



Descrença


Somos prólogos de histórias
Infelizes que construímos;
Que talvez nem nossas são,
Ou se são, não assumimos.

Parte de nação despencada
Sob os tapetes escondidos,
Os nossos próprios pecados
Jamais sequer assumidos.

Perdoáveis quando seus,
Hediondos quando não;
Pândegas feitas de breu,
Crias rastejando em vão.

Pecados pequenos que
Atenta e nunca assume,
Numa mescla de ilusão
Boa de seguir impune.

Pobres símios pelados,
De astúcia despojados,
Com cérebros graúdos
Pseudo bem-dotados.

Infeliz gado indecente
Que se faz tão ingente,
Porém tal como gente,
Nem sequer o sente.

E domado por inteiro
Mal sente a pontada
Quando o boiadeiro,
Cruel, o faz boiada.


Nardélio Luz
220417

terça-feira, 28 de março de 2017

Hi-Fi





Hi-Fi

Todos os dias, pontualmente as sete, dona Silvia e dona Vilma — vizinhas há décadas — saem de suas casas com vassouras em punho e grande empolgação para discutirem os capítulos das novelas, exibidos na noite anterior.
A essa altura ambas já serviram o café e despacharam os maridos para o trabalho e os filhos para a escola, estando livres para o ritual diário de varrer as folhas das Sibipirunas da praça em frente, que na primavera tecem um belíssimo tapete amarelo sobre o gramado e as calçadas.
Mas naquela manhã dona Vilma se atrasou alguns minutos e, quando saiu, encontrou dona Silvia “nos cascos”.
— O que houve, mulher? — a recém-chegada indagou cautelosa.
— Foi o descarado do vizinho que me faltou com respeito! — dona Silvia respondeu naquela irritadiça voz aguda. — Só não chamei a polícia para evitar fofocas e...
— Mas, qual vizinho?
— Walter Pilico, o viúvo grisalho de Araxá, 66 anos, comerciante, cuja esposa morreu de câncer, pai de uma filha e dois filhos, dois netos, que se mudou sozinho para a casa à esquerda da minha anteontem...
— O que aconteceu de tão grave, Criatura? — tornou a indagar dona Vilma, já aliviada da preocupação por conhecer bem a amiga.
— Imagina que enquanto eu a esperava, ele saiu para pegar o jornal. Usava apenas bermudas e camiseta regatas que lhe ressaltava a musculatura e...
— Sim, mas e daí? — a recém-chegada já perdia a paciência.
— E daí que — a irritação de Silvia crescia — gentilmente ofereci uma xícara de café fresquinho e ele não aceitou.
— Mas que mal há nisso?...
— “Devido à gastrite não posso aceitar o cafezinho, mas agradeço e aceito sua senha do Wi-Fi.” — Foram essas as palavras exatas do safado!
— E o que vem a ser Wi-Fi, Silvia?
— Não faço ideia, mas só pode ser alguma sem-vergonhice!

Nardélio Luz

segunda-feira, 13 de março de 2017

Rebeldia



Rebeldia

Eu não me lembro do lado de lá,
Mas não me impede de acreditar,
É questão de amar este lado de cá,
Pois melhor que esta vida não há.

Um dia, quando desta me cansar,
E minha validade aqui se expirar,
Pode ser que venha a desanimar,
Mas uma fagulha permanecerá.

E quando a morte vier me buscar,
Será decepcionante, posso apostar,
Pois decerto não haverá de gostar,
Do que neste ser ela encontrará.

Já que por certo irá testemunhar,
Um eu resoluto, disposto a lutar,
Para esta hílare vida prolongar,
E seu trabalho macabro adiar.

Certamente alguém irá decretar,
E logo do além chegará o alvará,
Mas a mim não será fácil levar,
Pois jamais irei me entregar.

Nardélio Luz
040317

sexta-feira, 3 de março de 2017

Desatinos



Desatinos


No aprazo da tua presença, eis que vivo;
Como a criança guiada pela ingenuidade.
Sigo reto, sem qualquer revés ou esquivo:
Pulcra encarnação da própria felicidade.

No suplício de não tê-la, eis que morro;
É uma doença que aos poucos se espalha.
Esvaído, tenho como opções de socorro:
A lenta ausência ou o gume da navalha.

Dê-me o bálsamo que anseia este peito;
Aplaque os prantos deste velho coração;
Olvide a atmosfera que incute este leito;
Explane a voz que alforria nossa canção.

Desta ossada que geme de fome e sede,
Rebenta o clamor que segreda e zomba:
Diz que é apenas um retrato na parede,
E como tal, a consciência me assombra.

Desfaça de vez tua mortalha nevoenta!
Abone aclaração: esta alma vos suplica!
Descarte o vil que a concebe e ostenta,
Nesses moldes que a ciência não aplica.

Beije-me com doce placebo da loucura,
Seguindo por me deixar à própria sorte.
Pois que a febre que arde não tem cura,
É irrelevante testificar a minha morte.


Nardélio F. luz
270217-03:19